Argentina expropria <i>Repsol</i>
A Argentina vai expropriar 51 por cento do património da petrolífera Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF), controlada pela Repsol. A presidente do país diz que a medida é de «interesse público nacional» e deixou de sobreaviso outras companhias estrangeiras que dominam sectores estratégicos do país.
«A factura petrolífera argentina superou os 7 mil milhões de euros em 2011»
Para Cristina Fernández Kirchner, a falta de investimento e as quebras na produção de hidrocarbonetos por parte da multinacional espanhola, bem como a necessidade de garantir um abastecimento de combustíveis fósseis consentâneo com o desenvolvimento económico harmonioso da Argentina, justificam a decisão.
«Vamos fazer uma recuperação e a companhia continuará a funcionar como uma sociedade anónima, com directores profissionais», esclareceu a presidente do país, que explicou ainda que o projecto de lei de 19 artigos a ser aprovado pelos deputados estipula a substituição da actual direcção e a entrega de 51 por cento do total do capital expropriado ao Estado, e 49 por cento do mesmo às províncias produtoras.
Na declaração pública, Cristina Fernández Kirchner frisou ainda que «não responderá a qualquer ameaça» e que é «uma chefe de Estado, não uma vendedora de legumes», referindo-se às ameaças e regateios de preços lançados por representantes do governo espanhol e da direcção da Repsol.
A factura petrolífera argentina ultrapassou os sete mil milhões de euros em 2011. A YPF-Repsol é lider do mercado local de combustíveis com mais de 1600 estações de serviço e 52 por cento da capacidade de refinação instalada.
A YPF foi transformada em sociedade anónima durante o governo de Carlos Menem, primeiro passo para a sua privatização. Em 1993, o Estado argentino mantinha 20 por cento do capital da sociedade e o direito de veto [golden share], ao passo que províncias argentinas detinham 12 por cento das acções, mas cinco anos volvidos, banco e fundos de investimento privados já detinham 75 por cento do total das acções.
Em 1999, a Repsol ganhou o concurso de privatização da parte que permanecia no sector público estatal, e, nesse mesmo ano, adquiriu 73 por cento das acções que se encontravam disperas por outras entidades.
Actualmente, a estrutura accionista da YPF reparte-se em 57,3 por cento detidos pela Repsol e em 25,46 por cento controlados pelo Grupo Petersen. O restante é transaccionado em bolsa.
Capital furioso
Confrontados com a decisão, os administradores da Repsol consideraram o acto «ilegítimo e injustificável» e acusaram Cristina Fernández de promover uma campanha contra a YPF com o objectivo de adquirir as acções da empresa a preço de saldo.
O presidente da Repsol, António Brufau passou depois às ameaças sublinhando que «estes actos não ficarão impunes» e anunciou o recurso à arbitragem internacional a fim de que seja estabelecida uma compensação de acordo com as suas pretensões.
Brufau esqueceu-se de destacar que a YPF representa 25,6 por cento dos resultados operativos anuais do grupo Repsol, e 21 por cento do total dos resultados depois de impostos.
O negócio da YPF representa também para a Repsol mais de metade do total da produção da multinacional espanhola e cerca de 40 por cento das suas reservas.
Ao lado do capital, o executivo de Madrid considerou a decisão argentina de «gesto hostil contra Espanha e contra o governo espanhol».
Primeiro passo?
«Todas as empresas presentes no país, e mesmo que o accionista seja estrangeiro, são empresas argentinas», disse a presidente do país das pampas, deixando de sobreaviso outras empresas estrangeiras que dominam sectores estratégicos da economia argentina, nomeadamente as espanholas.
A Telefónica, por exemplo, acusada por Buenos Aires de recentemente ter submetido a Argentina a um apagão nas telecomunicações, detém licenças de exploração de rede fixa, móvel e Internet. Os seus negócios no território ascendem a mais de três mil milhões de euros, fruto de uma quota de mercado de 30 por cento (quase 22 milhões de clientes).
Nos casos da banca, a filial da Santander é a maior entidade privada de crédito do país, com 358 agências, 2,5 milhões de clientes, sete mil empregados e uma margem bruta de 926 milhões de euros em 2011, aproximadamente três por cento do total dos lucros do grupo.
O BBVA, por seu lado, obteve o ano passado mais de 157 mil milhões de euros de lucros na Argentina, isto é, 5,2 por cento do total do grupo.
A Endesa, com mais de 130 milhões de euros de lucros obtidos na Argentina em 2011, o grupo retalhista Dia, a Prossegur e a Mapfre são igualmente empresas espanholas com fortes interesses instalados na Argentina que, no entender de Cristina Fernández, falham nos serviços prestados e no investimento.